A caneta.

O que seria da humanidade sem uma de suas melhores armas? A máquina de (re)produzir palavras e pensamentos. Conhecida como caneta.

O que seria do poeta sem a tinta? Ou do jornalista sem a redação? Do pintor e desenhista sem os riscos que a caneta faz?

A caneta escreve, marca e grifa. Ressalta o que é importante. Resume a vida em cores padrões: azul ou preta, com título em vermelho.

Sinto falta dela. Pobre caneta, esquecida pelo mundo, perdida pelos versos digitais, e arquivos nomeados texto1.doc. 

Dizem que escrever a mão faz memorizar mais fácil. A caneta traduz meus versos em arte física. 

Minha, só minha. Arte particular que fica trancafeada num caderno só meu. Escrito à caneta. Sem chances de ser apagada. 

A caneta marca o fato de o que foi feito não pode ser desfeito. E quando se tenta corrigir, as coisas borram e mancham.

Miguel Silva 6-12-15

Sou.

Vou roubar-te com meus silenciosos versos. Meu corpo é a minha arte. 

Desde então tornei-me poesia. 
Sou!. 

Soa estranho o murmúrio para quem esteve gritando. O inimigo agora é apenas a falta de semântica.

O silêncio tornou-se comum. 
O Incomum agora é pensar que algum dia eu cheguei a dizer coisas banais em voz alta. Não me leia em alto tom.

Sou poesia.
Sou expressão.

Sem chances alguma!
Num dizer monótono, o recíproco é apenas a vontade de estar longe, porque juntos, só se fere mais a fera.

Meu corpo é a minha arte.
A poesia compõe-se do ver.

Nota-se.
Veja-se.
Toca-se.
Seja.

Miguel Silva. 8.12.15


Enquanto fui arte...
 Os meus versos vêm acompanhados uma boa dose de amor, dos instantâneos aos mais intensos. Enquanto eu amava, eu era a arte. 
Mas a arte despedaçou-se como o choque de uma taça de vinho tinto caída no chão, que mancha de vermelho sangue o tapete. A arte se foi como as marcas dos amores que já partiram. Nem se quer disseram adeus.

Enquanto fui arte, me esvaziei dela. E eu ainda a era. Poesia corrompida com a marca do teu beijo que sela dentro do meu peito os versos que desgraçadamente amarguram meu coração. Enquanto eu amava, eu era a arte.


Sempre escrevia sobre os meus amores. Pequenas doses de vinho barato embreagem mais rápido do que qualquer garrafa envelhecida para degustação.

A arte dispara contra meu peito uma tristeza seca, coberta de desejos, que tenta, no mínimo, se embelezar de rimas bem pensadas. Formosa arte que se vai sem um beijo de despedida.
Enquanto eu fui arte, eu era vida. Enquanto eu fui arte, eu era poesia.

Mas não há mais versos nem poesias ou prosas. Não há mais amor. E o beijo que sempre quis fica enferrujados nos meus lábios, marcado pelo gosto do vinho derramado no tapete misturado no sangue dos meus versos pobres de arte que já não sou.

Miguel Silva 07.12.15
Então, de repente, o mundo parece vazio, como se sete bilhões de pessoas desaparecessem assim, num piscar de olhos, e todo o vazio é preenchido apenas pelo som de uma canção que toca no fundo da cena.


A ideia é encontrar uma solução para os problemas, mas, inevitavelmente, encontramos apenas mais perguntas. E enquanto a música toca, o filme acontece, o protagonista não sabe o que fazer. Permanece ali, sentado numa escadaria, ouvindo uma canção qualquer que ecoava por todos os cantos.  



O protagonista da história se perguntava porque ele, porque ele é quem deveria ficar sozinho no mundo, então chorou. O som da guitarra aumentou, e as lembranças percorriam a mente do personagem, o diretor colocou uma chuva, incrementou no drama o poder da ficção.



Um filme dentro de outro filme, era isso que ocorria na mente do protagonista. Ele se lembrou de seus amigos de infância, de como aprendeu a andar de bicicleta, da sua primeira vez na escola. Ele sorri com estranheza. Abre os olhos, ouve agora, o barulho da chuva e de fundo, a canção. 



Nada cortava aquele momento. Lembra do seu primeiro beijo, dos primeiros acordes que tocou, lembra do sorriso do pai, e da magia que sentiu quando mostrou para a família sua primeira música.



Um trovão cortou seu sorriso no meio, despertou-o. Mas, o mundo ainda estava vazio, ele estava só, o protagonista ainda estava sentado na escadaria, sem saber o que fazer, sem saber como trazer de volta as pessoas que mais amava e havia deixado partir.
Ele se perguntou se aquela solidão era reflexo de suas atitudes, de seus medos, de sua falta coragem, e vergonha. Ele repassou o filme todo, várias e várias vezes, mas não encontrou a resposta, ou algum tipo de erro. O protagonista se concentrou na música no fundo novamente, tentou pouco a pouco apagar os fortes estrondos que cada gosta de água causava ao tocar o chão.



Pouco a pouco, a música ficou alta novamente, e o som da chuva tomou lugar no fundo da cena. Ele estendeu a mão e tocou a chuva, ou a deixou toca-lo. Sentiu-se vivo, sentiu-se capaz de controlar a si e a suas atitudes. Ele suspirou, levantou-se da escadaria e caminhou lentamente para a chuva, tocando-a, deixando-se senti-la.


Imagem Retirada do Tumblr

Nosso protagonista agora caminhava pela chuva, no mundo vazio, passando pelos lugares que tinha o costume de ir, tentou passar por todos os lugares que considerava importante, mas desistiu, percebeu lugares era um tanto que importante para ele, porque cada lugar, cada rua, cada casa, cada dia, tinha uma importância para ele. 



O mundo estava vazio, nosso protagonista não sabia o que sentir, mas sabia que devia sentir, então permitiu-se, e pouco a pouco, ele foi se enchendo de sentimentos, o mundo se enchia de pessoas, o barulho da chuva havia sumido, o som da canção ainda tocava, ele ria, agradecido, porque sabia que ele era o seu próprio mundo. 



Ele permitiu que seu mundo se se enchesse novamente, e via as pessoas percorrer a cidade lentamente. O mundo vazio agora era cheio, nosso protagonista tomou conta de seu papel, foi cuidar dos seus afazeres, foi fazer o que sentia que devia ser feito.
O dia tinha amanhecido mais claro que o normal. Os olhos de Samuel quase não se abriam, seus olhos enxergava poucos metros a sua frente até que se acostumaram com toda a claridade em excesso.

Foto: Daniela Soares
Era dia, ele sabia disso, pois, ontem a noite, quando largou a máquina de escrever foi logo se deitar, esqueceu até mesmo de escovar seus dentes. Samuel ficou deitado no quarto olhando para a lâmpada no teto, como se fosse o céu. Imaginava ali, um final para o conto que não havia conseguido terminar minutos atrás.

Pouco a pouco ele foi adormecendo. Sem nenhuma ideia. Adormeceu debruçado para cima, olhando para o brilho da lâmpada. Esta que, passou a noite em claro cobrindo Samuel com sua claridade.

Nessa manhã extremamente clara, Samuel se perguntou o que é que havia acontecido para o dia estar tão luminoso. Quando abriu os olhos, pôde ver pouco do seu quarto. Notou que a luz havia sido apagada. "Foi minha mãe, provavelmente", pensou.

Samuel se levantou, foi ao banheiro, não conseguia se ver no espelho, mas não se questionou sobre isso, e continuou sua rotina. Sam, como seus pais lhe chamava, higienizou-se e depois foi para a cozinha. Tentou acender a lâmpada, mas não conseguiu, verificou também a da sala, por fim percebeu que estava sem energia. Pensou na lâmpada do quarto, cogitou a possibilidade de não ter sido a sua mãe que a apagou.

 Não havia ninguém em casa, todos já haviam saído, porém haviam deixado o café da manhã pronto. Pão integral com ovos mexidos e café puro. "O meu preferido", refletiu.

Um estranho silêncio pairava sobre a sala, ouvia-se o relógio da cozinha, um metódico tic-tac que pouco a pouco aumentou o incômodo de Samuel. Ele se levantou da cadeira, foi pro sofá, e tentou em falhas tentativas ligar a televisão. Quase se estressou, mas lembrou-se que não havia energia.

Samuel colocou o copo de café no chão, e caminhou até a tomada para remove-la. "Sempre que faltar energia, desligue a tomada dos eletrodomésticos, porque quando a energia voltar, pode ser que danifique o aparelho", ele se recordou do conselho do pai. Agachou-se e retirou a tomada. A televisão deu um pique de energia, mas ele deixou pra lá.

Ele foi até a janela, que estava com cortina fechada, abriu-a, e deixou uma maior claridade invadir toda a sala. Era quase impossível enxergar qualquer coisa na sala. "Está tudo muito claro, o que será que houve?", pensou. Quando foi para fechar a cortina, Sam percebeu várias vozes murmurando, o barulho invadiu a sala de repente.

Ele escutou por algum momento o que as vozes diziam. Sentiu-se incomodado com o que falavam sobre o clarão, uma das vezes disse que vinha dali, do apartamento 404. Samuel fechou novamente a cortina, tentando cessar ao máximo a claridade que invadia a casa.

Pensou no que fazer. Mas não fez nada. Apenas decidiu esperar a luz voltar.

No caminho de volta para o sofá, Samuel viu a máquina de escrever, parada ali, com um conto incompleto. Ele foi até ela, e releu alguns pedaços daquilo havia escrito na noite passada. "Ainda dizem que escrevo bem" pensou ele rascunhando um pequeno sorriso.

Samuel releu a última parte do texto que contava como o seu personagem não conseguia finalizar sua crônica. Samuel apagou o rascunho de sorriso, ficou sério novamente, coçou os olhos, se incomodou novamente com a claridade mas não reclamou. 

Decidiu voltar para sofá. Jogou a folha sobre a mesa da máquina de escrever a caminhou para o sofá.

Samuel sentou-se, colocou sobre o colo o prato com o pão e ovos mexidos e esticou o corpo para pegar o café no chão. Ao aprumar o corpo novamente, com o copo na mão, deixou o prato virar sobre o colo, assustado, o café quente derramou-se sobre ele. Ele gritou. No mesmo instante, ventou, e a claridade novamente tomou conta da sala, cegando-o.

Acordado, Samuel se depara com luz ainda acesa, vê que se passaram apenas alguns minutos desde abandonara o seu conto. Levantou-se, foi para a sala, sua mãe assistia a novela das nove enquanto comia. Sam foi para a cozinha, e preparou um lanche, pão integral e ovos mexidos, como de costume. 

Foi para até a janela com o prato na mão, olhou para fora, viu algumas crianças brincando na rua e quando voltou seu olhar para dentro viu a máquina de escrever com a crônica parada ali, pela metade.

Ele foi até la, sentou-se, colocou o prato ao lado da máquina de escrever. Tinha na cabeça uma ideia para terminar sua crônica. Imaginou dar como final, o sonho que acabou de ter.

Ele começou a digitar, escrever sobre o personagem que havia acabado de se deitar na cama e que caiu no sono. Minutos depois, ouve-se um estrondo enorme, sua mãe grita, ele se assusta, para de escrever, bate com a mão no prato e o derruba seu pão com ovos mexidos. Não consegue ver nada. A energia havia acabado. 

Na casa de Samuel estava tudo escuro, exceto a cabeça de Samuel, ela estava acesa, cheia de ideias para terminar sua crônica, mas que neste momento, teria que ser interrompida, porque não tinha como escrever no escuro. 


Samuel acabou sua crônica no outro dia, pela manhã, quando já há era claro e mesmo que ainda sem luz, poderia continuar escrever sua crônica.